Seu trabalho é pautado na competição? Sua produção é medida pelo seu lucro individual? Certamente! Assim aprendemos! Neste texto, Márcia Lima nos apresenta outra forma de trabalho e de organização para fazermos uma economia solidária baseada em relações mais igualitárias, onde cada um de nós deve olhar e considerar o outro. Olhe para este texto… Leia… Comente no nosso Blog!
Imagine uma economia onde as pessoas trabalham não apenas em busca de seus próprios interesses, mas também em prol do bem-estar coletivo. Esta é a essência da economia solidária, um sistema econômico baseado na cooperação, colaboração e solidariedade. Neste modelo, os trabalhadores se organizam para produzir, distribuir e consumir bens e serviços de uma maneira mais justa e equitativa. Com propostas alinhadas à sustentabilidade e desenvolvimento local, a economia solidária pode oferecer uma alternativa viável para criar comunidades mais resilientes e inclusivas.
Conceitualmente, a economia pode ser definida como o conjunto de atividades humanas que visam a produção, distribuição e consumo de bens e serviços necessários para a sobrevivência e a qualidade de vida. Etimologicamente, a palavra “economia” vem do grego “οἰκονομία” (oikonomía), que significa “regras da casa”, refletindo a ideia de administrar recursos de maneira eficiente e eficaz para garantir a sustentabilidade comum.
No entanto, de acordo com Paul Singer[1] (2002) a economia praticada em nossa sociedade é pautada pela competitividade e disputa com processos seletivos cada vez mais exigentes, gerando uma realidade de vencedores e perdedores com efeitos sociais cada vez mais excludentes. Além disso, a qualificação profissional se desenvolve cada vez mais focada no preparo para um mercado competitivo que destaca os que conseguem obter sucesso e invisibiliza aqueles que não conseguiram.
“A apologia da competição chama a atenção apenas para os vencedores, a sina dos perdedores fica na penumbra. O que acontece com os empresários e empregados das empresas que quebram? E com os pretendentes que não conseguem emprego? Ou com os vestibulandos que não entram na universidade? Em tese, devem continuar tentando competir, para ver se se saem melhor da próxima vez” (Singer, 2002, p. 8).
Enquanto a economia tradicional enfatiza a competição e a busca do lucro individual, a economia solidária visa promover relações mais igualitárias e sustentáveis entre os participantes, tendo em sua base princípios como:
Cooperação: objetivos comuns, união dos esforços, partilha dos resultados e responsabilidade solidária diante dos desafios;
Autogestão: a atuação consciente, empoderamento e comprometimento de cada trabalhador com o coletivo e a distribuição equitativa dos recursos produzidos;
Atividade Econômica: conhecimento integral da produção, prestação de serviços e comércio justo.
Solidariedade: ações desenvolvidas considerando a melhoria da qualidade de vida dos participantes, considerando, aspectos ambientais, comunitários, visando a construção de redes colaborativas.
No estudo de uma economia diferente, buscamos identificar os geradores de desigualdade social e as possíveis formas de transformação para regulá-los, entendendo a importância da equidade na diversidade. Assim, podemos garantir que todas as pessoas, independentemente de suas diferenças individuais (como raça, gênero, etnia, orientação sexual, etc.), tenham acesso justo e igualitário a oportunidades e recursos.
Nesse sentido pode-se destacar situações de maior vulnerabilidade onde a economia solidária vem contribuindo com grupos que se organizam em rede e promovem mudanças necessárias para o bem comum. Entre eles estão a agricultura familiar; os pontos de economia solidária e saúde mental; cooperativas de catadores; práticas de economia solidária voltadas à integração de pessoas em situação de rua.
As formas de organização da economia solidária incluem:
Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCPs): São iniciativas que visam apoiar a criação e o desenvolvimento de cooperativas populares e outros empreendimentos de economia solidária. Elas são, em sua maioria, ligadas a universidades e instituições de ensino superior, e procuram promover a inclusão social e econômica por meio da capacitação, assistência técnica e suporte organizacional.
Cooperativas: Organizações de pessoas que se unem voluntariamente para satisfazer suas necessidades econômicas, sociais e culturais comuns por meio de uma empresa de propriedade conjunta e democraticamente controlada.
Empreendimentos Autogestionários: Empresas geridas coletivamente por seus trabalhadores, onde as decisões são tomadas de forma democrática e a distribuição dos resultados é feita de maneira justa entre todos os membros.
Bancos Comunitários e Fundos Solidários: Instituições financeiras criadas e geridas pela comunidade para facilitar o acesso ao crédito e promover o desenvolvimento local. Esses bancos utilizam moedas sociais e práticas de finanças solidárias para fomentar a economia local.
Redes de Troca e Comércio Justo: Sistemas que promovem a troca de bens e serviços sem a intermediação de dinheiro ou com base em moedas sociais, valorizando a produção local e as relações justas de troca. O comércio justo também é uma forma de organização que visa pagar preços justos aos produtores e garantir condições de trabalho dignas.
Moedas sociais circularam em São Paulo como Cristal, Talento e a Miruca moeda social da população de rua da Associação Minha Rua Minha Casa (AMRMC), promoveu diversas práticas junto a população de rua, com uma rede de empreendimentos solidários incentivados pela ITCP FGV (Boletim, 2009).
Moeda social Miruca. Fonte: arquivos da autora (2008).
É importante ressaltar a importância da economia solidária, na geração de renda para pessoas em extrema pobreza, servindo como uma forma de evitar que sua condição de miserabilidade as leve à exposição de condições de trabalho precárias, ilícitos ou análogos à mão de obra escrava. Diferente de uma visão distorcida e estigmatizada que marca os viventes da rua como pessoas que não se esforçam para trabalhar, a população de rua faz parte da classe trabalhadora que enfrenta as dificuldades impostas pela exclusão e precarização da vida financeira (Filho & Soeiro, 2021). Assim, a economia solidária é a estratégia de inclusão socioeconômica e de autonomia da população em situação de rua do Plano Nacional Ruas Visíveis (Brasil, 2023).
As práticas integrativas em condições de trabalho decentes em que todos possam se sentir dignos e pertencentes na produção integral e coletiva, valorizando o ser humano, o trabalho, a cultura, é uma experiência desafiadora e solidária que vale ser vivida.
[1] Paul Singer (1932,2018), economista, titular da Secretária Nacional da Economia Popular e Solidária entre 2003 e 2016.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Boletim informativo da 28 feira de trocas solidaria do centro. (2009). Acesso em 05/2024. Disponível em https://feiradetrocascentro.blogspot.com/2009/07/boletim-informativo-da-28-feira-de.html
Brasil. (2010). Pelo direito de produzir e viver em cooperação de maneira sustentável. II Conferência Nacional de Economia Solidária, Brasília. https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/conferencias/Economia_Solidaria_II/deliberacoes_2_conferencia_economia_solidaria.pdf
Brasil. (2023). Ruas visíveis: Plano de ação e monitoramento para efetivação da Política Nacional para a População em Situação de Rua. Brasília. Acesso em 05/2024, disponível em https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2023/dezembro/governo-federal-lanca-201cplano-ruas-visiveis-pelo-direito-ao-futuro-da-populacao-em-situacao-de-rua201d-com-investimento-de-cerca-de-r-1-bilhao/copy2_of_V3_plano_acoes_populacao_de_rua1.pdf
Filho, J. C. M. B., & Soeiro, L. C. (2021). Economia solidária como forma de combate ao trabalho escravo. Periódicos Cesupa. http://periodicos.cesupa.br/index.php/RJCESUPA/article/view/29/16
Mattos, R. M., Heloani, R., & Ferreira, R. F. (2008). O trabalhador em situação de rua: Algumas ações coletivas atuais. Mental, 6(10), x-xx. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-44272008000100007&lng=pt&nrm=iso
Singer, P. (2002). Introdução a economia solidária. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo.
SOBRE A AUTORA:
Marcia Aparecida Ferreira Lima: Psicóloga, Especialista em Intervenções Comunitárias e Redes Colaborativas e Mestre em Ciências pelo Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Atuou na Coordenação do Projeto de Orientação para a Conscientização Ambiental OCA e na CooperadaMente, empreendimento de Economia Solidária apoiado pela ITCP-FGV (Fundação Getúlio Vargas), participando das feiras de trocas do Centro de São Paulo e do CECCO Jardim Ângela. Atualmente é colaboradora do Projeto Com Rua – Arte e Economia Solidária, Membro do Coletivo População Arte (POP ARTE) – educação em defesa da vida através da Arte-Cultura.
Parabéns pelo artigo! Excelente trabalho muito necessário. A autora também está de parabéns pela escrita.