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ALÉM DA DEPENDÊNCIA DE DROGAS: O QUE SÃO DEPENDÊNCIAS COMPORTAMENTAIS?

Atualizado: 18 de nov. de 2022


Quando o assunto é “dependência”, é comum a associação do termo única e exclusivamente à dependência de drogas (álcool, tabaco, cocaína/crack, entre outras substâncias), popularmente conhecida como “dependência química” (termo técnico atualmente substituído na literatura científica por "dependência de drogas" ou "dependência de substâncias"). No entanto, o conceito é muito mais amplo e engloba outros hábitos que ocorrem em frequência e intensidade que podem acarretar prejuízos à saúde física e emocional dos indivíduos (Davis et al., 2017; Grant et al., 2016; Goodman, 1990; Holden, 2001; Reichert et al., 2021a).


No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-5 (APA, 2014), encontra-se o termo “adições comportamentais”, seguido de uma breve explanação: “[...] grupos de comportamentos repetitivos [...] com subcategorias como ‘adição sexual’, ‘adição por exercício’ ou ‘adição por compras’ [...]” (p. 481). Contudo, apesar de mencioná-las, o manual não apresenta um tópico específico para tais, pois até então não haveria evidências suficientes para se estabelecer critérios diagnósticos para identificar esses comportamentos como transtornos mentais.



Na menção feita no DSM-5, é possível observar formas de dependência que não estão relacionadas exclusivamente ao uso de substâncias. Assim, dependências comportamentais (do inglês “addictive behaviors”) são definidas pela recorrência de comportamentos (como jogar, comprar, fazer sexo, praticar exercícios físicos e usar tecnologias) que geram prazer ou promovem alívio de sensações desconfortáveis e que persistem apesar de consequências negativas dentro da família, escola/universidade, trabalho, relações interpessoais e outras áreas da vida. Tal como no caso da dependência de drogas, estes padrões comportamentais são complexos e multifatoriais, envolvendo diversos aspectos biológicos, psicológicos e sociais (Alavi et al., 2012; Andrade et al., 2021; Cho et al., 2019; De Micheli et al., 2021; Leeman & Potenza, 2012; Petry, 2016; Reichert et al., 2021a).


Para aprofundar as reflexões e debates sobre o conceito de dependência comportamental, leia o artigo "How can we conceptualize behavioural addiction without pathologizing common behaviours?" (Como podemos conceituar a dependência comportamental sem patologizar comportamentos comuns?), de Kardefelt-Winther et al. (2017).

Pesquisas sugerem que as dependências comportamentais estão associadas à multimorbidades psiquiátricas, incluindo estresse, ansiedade, depressão, impulsividade, déficit de atenção e hiperatividade, entre outras (Berberovic, 2013; Cerniglia et al., 2017; González-Bueso et al., 2018; Granero et al., 2016; Liu et al., 2018; Pluhar et al., 2019). Do ponto de vista neuropsicológico, estes padrões de comportamento envolvem alterações estruturais e funcionais em diversas áreas cerebrais. De maneira geral, notam-se modificações no córtex frontal e estriado, córtex cingulado anterior, amigdala, substância cinzenta, circuitos dopaminérgicos e serotoninérgicos, entre outras regiões e mecanismos neurais envolvidos principalmente no processamento de emoções e recompensas, no controle cognitivo e na inibição comportamental. Confira abaixo alguns estudos sobre os mecanismos e circuitos neurais correlacionados mencionados:


Já do ponto de vista comportamental, é importante considerar as contingências que controlam a ocorrência do comportamento, ou seja, analisar as variáveis ambientais antecedentes e consequentes que aumentam a probabilidade de recorrência ou não da resposta (Oliani, Reichert, & Banaco, 2021; Tourinho & de Luna, 2010). Reichert et al. (2021b), por exemplo, realizaram uma análise funcional que contemplou aspectos culturais e sociais do uso problemático da Internet. Nela, os autores abordaram conceitos da modernidade liquida de Zygmunt Bauman (1925-2017) e apontaram que o uso excessivo da Internet pode ser uma estratégia de fuga e/ou esquiva dos problemas reais ou para aliviar estados de humor negativos. Em outras palavras, o comportamento, embora excessivo e potencialmente prejudicial, ainda é funcional ao indivíduo (Cho et al., 2019; Kardefelt-Winther, 2014; Tourinho & de Luna, 2010). Outros excessos comportamentais podem ser analisados a partir dessa ótica. É fundamental frisar que, comumente, estes são comportamentos socialmente aceitos e que produzem sensações agradáveis. A classificação de “dependência comportamental” surge quando esses comportamentos ocorrem em intensidades e frequências que podem causar danos sociais e problemas de saúde aos indivíduos e/ou terceiros (Reichert et al., 2021a).


Diante dos diversos possíveis prejuízos associados, torna-se necessário abordar algumas formas de intervenção eficazes para as dependências comportamentais. Embora estas compartilhem características em comum entre si, as intervenções são especificas. Abaixo, estão listados alguns estudos que avaliaram a eficácia e efetividade de algumas modalidades. Espera-se, com tais evidências, apresentar alguns caminhos para a formulação e aplicação de estratégias e técnicas assertivas e efetivas de tratamento, proporcionando assim melhor qualidade de vida aos indivíduos.

  • Cognitive behavioral therapy for compulsive buying behavior: Predictors of treatment outcome (Granero et al., 2017)

  • Problematic cybersex: Conceptualization, assessment, and treatment (Wéry & Billieux, 2017)

  • Treatments for compulsive buying: A systematic review of the quality, effectiveness and progression of the outcome evidence (Hague et al., 2016)

  • Treatments for Internet gaming disorder and Internet addiction: A systematic review (Zajac et al., 2017)


 

SOBRE OS AUTORES:


Marco Antonio Brandini Argento: Graduando em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).


Richard Alecsander Reichert: Doutorando em Psicobiologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Pesquisador na área de Medicina e Sociologia do Abuso de Drogas. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7744495824597038


Denise De Micheli: Doutora em Psicobiologia e Pós-Doutora em Ciências. Professora Associada da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2246867228137055

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